Após recuo, sinais de estabilização da pandemia no RS geram temor de novo agravamento

Depois de atingir um pico e começar a recuar rapidamente, a pandemia de coronavírus intensificou sinais de estabilização no Rio Grande do Sul nas últimas semanas. A média de novos casos notificados nos últimos sete dias é 13,9% superior à verificada 14 dias antes, e a ocupação de leitos clínicos praticamente estacionou após encolher pela metade ao longo de um mês.

O temor de especialistas é de que a interrupção na queda dos indicadores que costumam apontar de forma mais precoce os rumos da doença seja o primeiro indício de uma reversão de tendência e de um novo agravamento da covid-19 no Estado — que ainda apresenta patamares elevados de contaminação e de demanda por atendimento. A progressiva retomada da mobilidade e a celebração do Dia das Mães neste domingo (9), quando aumentam contatos familiares, reforçam essa preocupação. 

— No momento, estamos em uma estabilização pós-queda, o que é preocupante, pois é o primeiro passo de uma possível reversão de tendência — analisa o cientista de dados e coordenador da Rede Análise Covid-19 Isaac Schrarstzhaupt. 

A média móvel de notificações diárias de novos casos (calculada para os sete dias anteriores) chegou a superar 8 mil em 10 de março. Duas semanas antes de quinta-feira (6), havia recuado para 3,6 mil registros (veja gráfico abaixo). Mas, na quinta, tinha avançado para 4,1 mil, o equivalente a um crescimento de quase 14% neste período. Além disso, foi o oitavo dia seguido em que essa média permaneceu acima do patamar de 4 mil casos.

Schrarstzhaupt lembra que os registros por data de notificação podem ser afetados por questões como atraso (o que pode reduzir artificialmente o número) ou a inclusão de dados que se encontravam represados (o que pode aumentá-lo). Mas, na primeira hipótese, só poderia indicar uma situação ainda pior e, no segundo, quando isso ocorre costuma haver um período com poucas notificações seguido por uma quantidade de lançamentos muito superior ao padrão — olhando-se os gráficos relativos ao Rio Grande do Sul, não há sinais de que isso tenha ocorrido nas últimas semanas.

O registro por data de início dos sintomas é mais fiel à realidade, mas costuma demorar muito mais para aparecer nas estatísticas oficiais, o que pode levar à falsa impressão de que o cenário é de melhora no curto prazo. O quadro de atenção é confirmado por outros indicadores precoces, como a ocupação de leitos clínicos (vagas em unidades de terapia intensiva e quantidade de óbitos costumam ser afetadas somente semanas após o aumento na circulação do vírus).

O número de doentes em leitos clínicos chegou a 5.435 em 12 de março e, em pouco mais de um mês, despencou 50% — chegando a 2,7 mil em 15 de abril. Nas últimas duas semanas, porém, essa queda perdeu velocidade e agora o indicador se encontra praticamente estável e oscilando pouco acima das 2 mil vagas ocupadas (veja gráfico logo abaixo).

Outro indicador que pode ser usado para tentar prever o rumo do coronavírus é a taxa de positividade dos exames — um índice muito elevado pode indicar que estão sendo realizados poucos testes, o que deixa espaço para a doença se espalhar silenciosamente ou que o nível de infecção é muito elevado.

O virologista Fernando Spilki afirma que na Universidade Feevale, onde são feitos exames para vários municípios gaúchos, essa taxa vem oscilando em um patamar bastante significativo, ao redor de 35%, nas últimas semanas. Um percentual considerado baixo o suficiente para demonstrar que a doença está sob controle, segundo Isaac Schrarstzhaupt, deveria ficar entre 1% e 2%.

— O número de casos de fato vem aumentando, apesar de uma queda no número de exames realizados — alerta Spilki.

A imunização de 21,6% da população do Estado com uma dose de vacina e de 9% com duas, embora ajude a prevenir mortes, ainda é insuficiente para barrar o vírus. A chamada imunidade coletiva é alcançada, dependendo ainda de medidas preventivas como distanciamento social e uso de máscaras, com algo ao redor de 70% das pessoas vacinadas.

Maior mobilidade e Dia das Mães reforçam preocupação de especialistas

O contexto social em que surgem sinais preliminares de uma possível reversão de tendência da pandemia no Rio Grande do Sul ajuda a aumentar a preocupação de especialistas. A retomada da mobilidade a partir da flexibilização de restrições e a celebração do Dia das Mães no domingo, quando muitas famílias se reúnem, são citados como possíveis focos de risco para as próximas semanas e meses. 

— Uma estabilização após um decréscimo pode corresponder ao início de uma nova subida. Vimos isso acontecer recentemente, e essa é, infelizmente, a nossa expectativa neste momento, até em virtude do evidente aumento na mobilidade geral — avalia o virologista e professor da Feevale Fernando Spilki. 

Segundo o mais recente relatório de mobilidade do Google, que usa dados anônimos dos celulares para medir a circulação das pessoas, na terça-feira (4), os deslocamentos a locais de trabalho estavam apenas 5% abaixo do padrão anterior à pandemia no Rio Grande do Sul. Na média de fevereiro a abril do ano passado, por exemplo, essa cifra foi 36% inferior ao patamar pré-covid-19. 

Para o virologista, uma combinação entre diferentes fatores como essa pode aumentar o nível de contaminação nos próximos dias e, em um prazo que pode ser de semanas a meses, fazer a pandemia retomar fôlego. 

— O aumento de mobilidade, somado ao Dia das Mães, à diminuição das temperaturas, entre outros elementos, pode repetir o quadro que vivemos no ano passado a partir dessa mesma época, só que em uma magnitude inédita — alerta Spilki. 

Em 2020, durante o inverno, os gaúchos viveram uma onda da doença a partir de junho até agosto. Mas aquela fase de crescimento da covid-19 teve início com patamares de contaminação e hospitalizações inferiores aos atuais. O temor é que uma retomada do vírus possa agravar um cenário que já não é favorável. Na tarde desta sexta-feira (7), a ocupação geral das unidades de terapia intensiva (UTIs) no Estado estava em cerca de 80%. Em Porto Alegre, era de 87%.

Fonte: GZH

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