Estudo identificou 19 linhagens do coronavírus em circulação no RS desde o início da pandemia

Desde o início da pandemia no Rio Grande do Sul, foram identificadas 19 linhagens diferentes do coronavírus em circulação no Estado. Entre estas variantes mapeadas, as mais frequentes em território gaúcho foram, na ordem, B.1.1.33, B.1.1.28, P2 e P1. Esse é o panorama apontado na terceira edição do Boletim Genômico, da Secretaria Estadual da Saúde (SES) e do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs), divulgado na quinta-feira (4). O estudo foi realizado em parceria com o Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e a Universidade Feevale. 

No levantamento, foi atualizado o status de circulação do coronavírus no Estado. Para o escopo da pesquisa, foram consideradas as amostras colhidas entre novembro de 2020 e a oitava semana epidemiológica deste ano. Feito isso, o Rio Grande do Sul enviou mais de 260 amostras para a Rede Genômica do Ministério da Saúde, e esse material foi sequenciado pelo Cevs, pelo HCPA e pela Feevale.  

A grande variedade de linhagens para o coronavírus é esperada, afirma Tatiana Gregianini, especialista em saúde do Laboratório Central do Estado (Lacen), ligado à SES. 

— Ele (coronavírus) tem uma grande capacidade de mutação. Já no início da pandemia, tínhamos entre seis e sete variantes circulando no Estado. Naquela época, isso significava que tinham ocorrido diferentes importações da doença de outras localidades do mundo, como a Ásia, Europa e América — diz Tatiana.  

Soma-se a essa característica natural da doença a permissividade de espaço para sua circulação, aponta o especialista em Saúde do Lacen Richard Salvato: 

— Onde o vírus circula com mais facilidade, cria-se espaço para que haja mais mutações que podem mudar o comportamento dele. As medidas de restrição são adequadas, mas é importante que a população entenda que a mobilidade acarreta a criação de novas linhagens. Para conter esse avanço, é necessário restringir a circulação de pessoas.  

O Boletim Genômico pontua que, apesar do aumento no número de linhagens circulantes, poucas são as que causam preocupação quanto a alterações no comportamento do vírus. São elas a variante do Reino Unido, detectada em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Goiás e no Distrito Federal; a da África do Sul, não identificada no Brasil até o momento; e a cepa de Manaus, ou P1, que já foi mapeada no Rio Grande do Sul.  

Na análise regional, apesar de as variantes P2 e P1 aparecem em terceiro e quarto lugar, respectivamente, como as mais encontradas no Estado, elas são as que mais preocupam os especialistas. A cepa P2, identificada originalmente no Rio de Janeiro, carrega a mutação E484K no ponto de ligação do receptor da proteína Spike. Além disso, ela se tornou uma das versões mais frequentes da covid-19 no Estado, principalmente partir de novembro do ano passado. Já a P1 desembarcou no território gaúcho em janeiro de 2021 e é associada à explosão de casos de covid-19 em Manaus por sua alta capacidade de reprodução e de transmissibilidade.  

Salvato afirma que a estimativa é de que a P1 tenha aumentado sua presença no Brasil e no Rio Grande do Sul recentemente:  

— Uma nota técnica, divulgada pela Fiocruz na quinta-feira (4), revelou que 62,5% das amostras gaúchas eram de pessoas contaminadas com uma variante que apresentava uma mutação comum à da Manaus, do Reino Unido e da África do Sul. Mas como não temos registro de transmissão comunitária dessas duas últimas, a maior probabilidade é de que seja realmente a de Manaus. 

Estudo aponta transmissão comunitária na primeira morte do RS por nova variante 

Atualmente, há registro da variante de Manaus em, ao menos, 10 Estados. No Rio Grande do Sul, a primeira morte pela linhagem ocorreu em Gramado, em fevereiro de 2021, e está atribuída à transmissão local da variante na cidade. De acordo com artigo publicado, entre outras pessoas, por Tatiana e Salvato, o caso coincidiu com o aumento no número de internações por covid-19 em Gramado e Canela.   

A especialista em saúde do Lacen relata que a vítima era um idoso de 88 anos que praticava o isolamento social, mas mantinha contato com funcionários da casa que ficavam em trânsito. Ele apresentou quadro respiratório em 29 de janeiro e foi internado na UTI do Hospital Arcanjo São Miguel em 3 de fevereiro. Morreu sete dias depois. 

— Gramado é uma cidade turística, muitas pessoas do norte do país vieram para cá, assim como outras tantas gaúchas foram em direção àquela região. Trabalhamos com essa hipótese de cadeia de transmissão. No caso desse senhor que faleceu, ele manteve contato, em casa, com uma pessoa que esteve com um motorista, que acompanhava turistas, e estava contaminado — explica.  

Fernando Spilki, coordenador da Rede Corona-Ômica do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (dedicada a rastrear mutações do coronavírus no país), afirma que a falta de restrição na mobilidade dos indivíduos é um problema a ser atacado: 

— As pessoas criticam a vinda de pacientes do Norte para cá, mas eles vieram para o Estado com os mais diversos cuidados de biossegurança. O problema foi e é a falta de bloqueio para viagens de passeio. Nada foi feito para conter essa movimentação e, agora, somos julgados por essa decisão.  

Cepa P1 em expansão 

O informe aponta que o Laboratório de Pesquisa em Resistência Bacteriana do HCPA identificou 25 amostras pertencentes à linhagem P1 entre pacientes do HCPA. Para os testes, foram selecionadas amostras de perfis com maior probabilidade da presença dessa variante, como contato com pacientes provenientes da região Norte, mais jovens e com carga viral alta. De acordo com o boletim, “foram analisadas amostras de pacientes, funcionários do hospital e de um voluntário de pesquisa. Essas amostras pertencentes à linhagem P1 identificadas demonstraram a ocorrência da transmissão comunitária dessa linhagem também na região metropolitana de Porto Alegre”. 

O estudo revela também que, das mais de 32 linhagens do coronavírus identificadas no Brasil, segundo a Rede Genômica da Fiocruz, é possível notar o surgimento das linhagens P2 e P1 no terceiro e quarto trimestres de 2020.  

Segundo Spilki, análises como essa são importantes para que os gestores públicos, dos três diferentes níveis de atuação, tracem medidas de combate à pandemia. Ele diz que, com essa análise, comprova-se a presença das linhagens P2 e P1 e cresce a necessidade de os gestores aprofundarem medidas de restrição: 

— Nossa vacinação é lenta e insuficiente. Não é questão de avaliar a implementação de medidas mais duras. Mas, sim, de adotá-las, porque quebramos todos os recordes de ocupação de leitos, número de novos casos por dia e de mortes. Infelizmente, teremos, pelo menos, mais duas semanas de crise. E isso é reflexo da permissividade que plantamos diante das aglomerações do verão. Estamos colhendo os frutos.

Fonte: GZH

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